quarta-feira, 20 de julho de 2011

Sorocaba, uma cidade "aprendente"

92 Km separam a caótica São Paulo da cenográfica Sorocaba. No relógio a distância se traduz em cerca de 1 hora, já considerando o habitual transito intenso da capital.

A cidade nascida em 1654, 100 anos após a fundação da capital do Estado de São Paulo transformou-se num marco obrigatório para os tropeiros devido a sua posição estratégica, eixo econômico entre as regiões Norte, Nordeste e Sul. Este fluxo intenso de pessoas e riquezas promoveu o desenvolvimento do comércio e das indústrias caseiras baseadas na confecção de facas, facões, redes de pesca, doces e objetos de couro para a montaria. E essa prosperidade quase quadricentenária se revela atualmente numa cidade organizada, limpa e administrada com visão empresarial. Tem atuação destacada nas áreas de saúde e educação, sendo uma das representantes brasileiras do programa Cidade Educadora da Unesco e da rede de Cidades Saudáveis, da OMS.

Ao circular por vários cantos da cidade fiquei com a impressão de estar dentro de um bem cuidado cenário. Senti em vários momentos estar vivendo em uma realidade paralela, numa espécie de Show de Truman. O toque de realidade ficou por conta de pessoas jogando lixo na rua, de alguns dos inúmeros gramados coalhados de bitucas de cigarro e bairros distantes do centro que revelaram uma ocupação desordenada com suas casas cruas amontoadas. Porém, mesmo nesses locais pude ver equipamentos públicos tinindo de novos oferecendo à população serviços de qualidade.
E nesses cenários quase perfeitos pude assistir a apresentação de alguns personagens emocionantes, inspiradores e, felizmente, bem reais.

Vou começar pela Rosangela Cecília da Silva Alves, fundadora do Centro Cultural Quilombinho, é uma mulher forte, falante e realizadora. Por acreditar que “para existir tem que existir”, criou sua ONG há 8 anos para promover o resgate da auto-estima dos escravodescendentes através da valorização e da difusão da rica cultura afro-brasileira. Num depoimento emocionado e emocionante explicou onde nasceu o impulso de jogar luz sobre a história de seus antepassados: “Minha mãe queria que eu estudasse na melhor escola pública da cidade, tive que fazer vestibulinho. Passei e no primeiro dia de aula constatei que era a única negra matriculada, fui hostilizada pelos colegas, voltei para casa chorando e disse à minha mãe que haviam me chamado de negra. Sem hesitação ela me colocou à frente do espelho e perguntou o que eu via. Foi o espelho que me mostrou que eu tinha que fazer o que eu faço”.
“Seu Quilombinho” recebe crianças de todas as etnias, “até mesmo porque não faria sentido divulgar a cultura afrobrasileira somente para os negros, pois se trata da história do Brasil e não de um só povo”, diz Rosângela.

José Orivaldo Simonetti, um dos fundadores da ONG Piracema é um sorocabense - assim são chamados aqueles que nascidos em outras cidades, adotaram Sorocaba para viver. Idealista, deixou a carreira de engenheiro para atuar como terapeuta comunitário e liderar com seu grupo o Projeto Fazendo Futuro, desenvolvido em parceria com Prefeitura de Sorocaba, por meio das secretarias da Educação e da Saúde. O projeto prepara os adolescentes, entre 13 e 18 anos, para dar orientação aos colegas da mesma faixa etária sobre os riscos da gravidez precoce, DSTs e outros assuntos.
Simão, como é conhecido, arregassa as mangas junto com Alexandra Teixeira, Ivana de Barros, Karla Paiva Teixeira, Mariane Torregiane e José Antônio Micheletti e com seu dedicado trabalho torna possível para muitos jovens uma nova visão de mundo.

Silvia Donnini é outra sorocabense inspiradora. Nascida em São Paulo, mudou-se para a cidade há 20 anos e atualmente é diretora da Área de Gestão Pedagógica, da Secretária de Educação. Começa a conversa dizendo que Sorocaba é uma cidade aprendente. Na sua visão a cidade não pode crescer sozinha, se os municípios ao redor não se desenvolverem, compromete o progresso da região. Ela é adepta da “fazeção”, pois acredita que é no dia a dia que as inconsistências do planejamento – que ela não dispensa – aparecem e daí podem ser corrigidas.

Ela contou que o sucesso percebido no momento é fruto de um trabalho iniciado há cerca de 20 anos e que gestão após gestão preserva-se o que foi aprovado pela população, que participa ativamente das discussões. Segundo Silvia Donnini, os munícipes foram sensibilizados para não pedir para si e sim para o bairro, para o todo. Esse trabalho exitoso só é possível por se pensar na intersetorialidade, na interação e integração das várias secretárias de governo, baseadas nessa escuta do que vem do povo.

Outro ponto apontado como determinante para o sucesso é o fato de contar com um líder inspirado e inspirador, que, aliás, é assim que Silvia busca formar sua equipe. Segundo ela, “trabalhar o sonho protege”.
O tema educação na cidade é norteador de várias políticas e para isso um projeto Ecopoliticopedagógico, elaborado em parceira com o Instituto Paulo Freire, serve de guia para as muitas ações da prefeitura.
  • Educar para pensar globalmente
  • Educar para os sentimentos
  • Ensinar a identidade terrena como condição humana é essencial
  • Formar para a consciência planetária
  • Formar para a compreensão
  • Educar para a simplicidade e para a quietude
Uma da marcas da gestão pública na educação são os bem sucedidos Roteiros Educadores, uma iniciativa que valoriza os vínculos e o aprendizado na cidade, com a cidade, é um programa que leva as pessoas a uma viagem na qual história, cultura, arte e educação são apresentadas de forma lúdica por meio de um passeio a Sorocaba.

O sonho de Silvia é daqui 10 anos ser reconhecida por seu trabalho coerente e consistente e que pensou em cada uma das crianças da cidade e que não ficou “nenhum a menos”.

Além da diretora pedagógica, quero falar, também, duas diretoras de escolas municipais e o que mais me chamou a atenção é o comprometimento delas com seu público, que não se limita às crianças matriculadas e sim a toda a comunidade que vive em torno de seus estabelecimentos. Por conta do meu trabalho ligado às questões sociais já tive oportunidade de conhecer muitas escolas Brasil afora, mas confesso que espaços tão bem cuidados física e administrativamente não havia visto até então. Um deles, a Oficina do Saber, instalado num dos bairros cheios de casas simples e população de baixa renda parecia um oásis no meio do deserto. Tudo limpo, organizado e com seus gestores orgulhosos e zelosos.

E para fechar a lista de personagens, que falar de Alessandra França, uma jovem de 25 anos, com aparência frágil e delicada, mas com uma força e determinação comoventes. Da família simples e batalhadora ela herdou o olhar prático e o espírito de luta. Demonstra saber exatamente o quer para a sua vida e para os empreendedores que procuram o Banco Pérola, instituição financeira voltada ao microcrédito, que ela fundou há pouco mais de 1 ano. Trata-se de uma OSCIP Creditícia, ou seja, embora trabalhe oferecendo crédito, não visa ao lucro. O objetivo do Banco Pérola é o desenvolvimento social, dando acesso a crédito a jovens empreendedores, de 18 a 35 anos, que não conseguiriam empréstimo, devido à exigência de condições e de garantias dos bancos tradicionais. Reverente ao seu passado batizou seu negócio social com o mesmo nome do projeto que a formou e despertou o espírito de liderança. Foi difícil segurar as lágrimas ao ouvir sua história.

Aos 19 anos já era coordenadora do Sabe Tudo, espécie de Lan House pública, iniciativa da Prefeitura e gerenciada pelo Projeto Pérola, a ONG que abrigou as primeiras iniciativas da moça. Em pouco tempo ela percebeu que poderia dar passos mais ousados e a idéia do banco foi nascendo. Inspirada na experiência do Nobel da Paz Muhammad Yunus quis dar uma força para aqueles que não tem oportunidade de colocar seus sonhos em prática por falta de recursos. Atualmente, apóia cerca de 70 empreendimentos que estão mudando a vida, antes sem horizontes, de vários jovens da cidade.

Na pauta da jovem “banqueira” estão parcerias com os gigantes Santander e Caixa Econômica Federal e um plano pessoal de deixar o banco em 5 anos, para isso quer preparar seus sucessores, jovens como ela, que hoje são funcionários do banco. Sobre eles, disse: eles confiam muito em mim e isso até dá medo.

Mas, o que ela quer deixar é uma história para os outros contarem e partir para uma carreira de consultoria e facilitação. Que seja bem vinda, Alessandra.

E que seja bem vinda a vida pós Sorocaba, uma verdadeira jornada de aprendizagem que renovou minha crença na capacidade humana de fazer o bem. E bem feito.
"Missão" de uma das escolas municipais.  

Bom exemplo

Ontem pela manhã, tentava me concentrar na elaboração de um texto em meio à barulheira tipica de quem mora há poucos metros de uma grande avenida na cidade de São Paulo. A zoada estava dentro do aceitável até que britadeiras começaram sua incomoda sinfonia. Fui até a varanda para ver o que acontecia. Tratava-se de uma obra da Comgás, uma entre tantas que abrem buracos nas nossas ruas.
Porém, ali tinha algo diferente. Além de operários e suas ferramentas usuais havia 4 lixeiras disponíveis para que o lixo produzido pela equipe fosse adequadamente separado.
Curiosa, não me contive e atravesei a rua para conversar com os trabalhadores. Perguntei a um deles sobre a iniciativa e ele informou tratar-se de política da empresa. Confesso que pareceu-me que apesar do recursos disponíveis, os rapazes não entendiam exatamente qual era o propósito. De qualquer forma, a iniciativa é louvável.
Ainda instigada fui buscar informações na empresa e tive outras boas surpresas: o atendimento da ouvidoria realizado pele Nilce foi cortez e eficiente, encaminhando-me à área de imprensa. Lá quem me atendeu, também, cheia de boa vontade foi a Tatiana que confirmou a prática da Comgás.
Ainda quero saber mais sobre esse processo, como os funcionários são treinados, que tipo de informação recebem sobre coleta seletiva e reciclagem, se são orientados a levar a prática para suas casas,  qual é impacto da ação junto à população, como surgiu a idéia, quem cuida internamente e quais os frutos que a Comgás tem colhido? 
Aguardem novos posts sobre o tema, pois boas práticas merecem ser divulgadas e fomentadas.

Foto: Sandra Quinteiro